Os múltiplos fatores que influenciam na dor crônica

Múltiplos fatores que influencim na dor crônica

 

A ideia de começar a escrever esse texto, e outros que virão sobre dor, já era antiga. A idéia ressurgiu durante uma conversa com uma paciente que acompanho há alguns anos. Essa paciente tem dor crônica e usa altas doses de morfina via intratecal como tratamento.

Cabe aqui uma breve explicação: Intratecal é um termo utilizado quando a morfina é administrada diretamente na coluna. Nesse caso,uma bomba infusora que fica alojada sob a pele injeta continuamente morfina ao redor da medula. Comparado com a morfina via oral ou endovenosa, são necessárias baixíssimas doses de morfina (até 100 vezes menor do que a dose endovenosa) para tratar determinados tipos de dor crônica. A possibilidade de efeitos colaterais é muito menor. Quando bem indicado, é um excelente tratamento. 

Então, eu comentei com a paciente que em determinadas épocas do ano conseguimos diminuir a dosagem da morfina e em outras precisamos aumentar. Por que será que isso acontece com ela e com outros pacientes? Ela sofre com essa dor há muitos anos, a doença está bem estabelecida, os fatores causadores estão estáveis, mas a intensidade da dor varia. A resposta foi um pouco do que eu já esperava: segundo ela “são múltiplos fatores”.

Um olhar mais atento a esses “múltiplos fatores” pode ser benéfico para o tratamento dela e de outros pacientes com dor crônica. Abordar essa questão em uma consulta médica é fundamental. Entretanto, no dia-a-dia, com a correria com que precisamos nos mover de um paciente a outro nos impedem de entrar nesse assunto. Acredito que escrever textos sobre fatores que podem influenciar no tratamento e também explicar um pouco de como o cérebro interpreta a dor crônica pode ajudar os pacientes e substituir um pouco essa conversa, além de tirar dúvidas.

Será que é a intensidade da dor que muda ou é a maneira como a paciente percebe a dor que varia com o tempo? Em uma pesquisa realizada na Cleveland Clinic, nos EUA, 10 pacientes receberam implantes de eletrodos cerebrais para dor crônica neuropática. Esses pacientes foram selecionados porque eram refratários a todos os outros tipos de tratamentos. Nesse estudo, no entanto, ao invés de implantar eletrodos de estimulação nos centros do cérebro responsáveis pela dor e sensibilidade, os médicos optaram por implantar eletrodos em uma região que está envolvida com as emoções e o comportamento. O objetivo era tratar o aspecto emocional da dor. O resultado foi muito interessante: a intensidade da dor pacientes não diminuiu, mas o sofrimento dos pacientes melhorou substancialmente, melhorando assim a qualidade de vida deles.

Por experiência própria, quando eu informo os pacientes sobre a evolução, dos diferentes tipos de dor crônica (ex. dor nociceptiva ou dor neuropática) e sobre estudos como o que eu citei acima eu percebo que o fato de se educar é terapêutico por si só. Acredito que o simples fato de ficar alerta, mais consciente da dor e dos seus mecanismos já pode ajudar. Portanto, nos próximos textos pretendo abranger não apenas o componente afetivo da dor mas também escrever um pouco mais sobre a visão da dor crônica sob a ótica de um neurocirurgião que atua nessa área.

Se você tem alguma sugestão para um texto abordando algum assunto específico desse artigo ou qualquer outro assunto, envie um email para contato@leonardofrizon.com.br.

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